"No dia em que a flor de lótus desabrochou
A minha mente vagava, e eu não a percebi.
Minha cesta estava vazia e a flor ficou esquecida.
Somente agora e novamente, uma tristeza caiu sobre mim.
Acordei do meu sonho sentindo o doce rastro
De um perfume no vento sul.
Essa vaga doçura fez o meu coração doer de saudade.
Pareceu-me ser o sopro ardente no verão, procurando completar-se.
Eu não sabia então que a flor estava tão perto de mim
Que ela era minha, e que essa perfeita doçura
Tinha desabrochado no fundo do meu coração. "

Rabindranath Tagore








quinta-feira, 3 de abril de 2014



"Olha, perdoe esse meu cansaço, esse meu suor. Corri tanto, tanto... Desfaleci. Hoje o desafeto demorou um pouco mais na cozinha. Cortei os legumes com tanta pressa que quase aprontei com os dedos (com os medos, quem me dera). Fiquei aflita com esse texto se aninhando em minha mente enquanto eu estava lá absorta, com um suspiro preocupado que nunca soube repousar. Hoje sou só algumas mãos arredias cuidando dos tomates, esmiuçando os pensamentos. Hoje pra mim ainda é ontem. O amanhã cansou de chegar. Estou levemente desamparada, esvoaçada, ouvindo a mesma música. (O mar dessa canção me (co)move, me sensibiliza). Mas estou incomodada ainda, observando. Arrumei a casa de um jeito tão negligente que suspeito estar assim por dentro: do avesso. Poeira maior deixo sobre a mesa — de centro. Centro do meu mundo, do meu tudo, ventre desarrumado. Ainda não pude desincrustar a alma com alguma alegria. Logo cedo recebi visitas, preciso esperar a hora dos choros. A dor precisa de espaço para se repetir e morar, e logo depois sair imune, dissolvida. Por um momento sinto-me bem. Poesia salva, sabia? Uma salvação repentina que me diminui pra ficar maior... Quase não consigo contê-la nesse trecho. Pretendo esperar o próximo parágrafo enquanto dou um jeito nesta cama. Quase agora um Amor antigo questionou o meu silêncio e adicionou, cheio de medo: “Entendo, tem dias que a gente não está pra ninguém, não é?”, fiquei um pouco mais triste por envolvê-lo nesse meu cansaço (tão antigo, tão pequeno) e respondi, cheia de dedos: “Se quiser, você pode não estar pra mim hoje também. Vou gostar de você do mesmo jeito, talvez, de um jeito um pouco maior”. E ele me enviou um sorriso tão teimoso, desentendido e bonito que eu desisti — Meu Deus, eu desisti!! — da amargura do meu próximo desalento. Poesia salva, sabia? Poesia salva..." 

Priscila Rôde




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